Início Opinião Autismo: conscientização, inclusão e desafios em abril e durante todo o ano

Autismo: conscientização, inclusão e desafios em abril e durante todo o ano

0
Colunistas Visão - Solange Aroeira
Coluna de Solange R. Aroeira no Visão Oeste

Neste mês de abril, temos a oportunidade de refletir e agir. No dia 2, comemoramos o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, e é fundamental que a população compreenda e se sensibilize com esse tema tão importante.

Estudos de genética sugerem que entre 60% e 90% do risco de autismo pode ser atribuído a fatores genéticos. Isso significa que a suscetibilidade ao autismo pode ser fortemente influenciada por herança genética. Recentemente, a nomenclatura do Autismo, que é um transtorno neurológico, foi atualizada no CID-11 (Classificação Internacional de Doenças), passando a ser conhecida como TEA (Transtorno do Espectro Autista). Portanto, se é uma classificação internacional, estamos falando de algo que extrapola o senso comum de algumas pessoas que dizem que autismo virou “modinha”. Parece óbvia essa associação, só que não, pois me deparo o tempo todo respondendo a esta questão.

No Brasil, temos até 2027 para essa adequação do CID-11. Essa mudança reflete a necessidade de uma visão mais abrangente e cuidadosa acerca das particularidades de cada indivíduo, respeitando a diversidade que compõe o espectro.

O lançamento do filme “The Unbreakable Boy” (Invencível) 2025 traz com carinho o olhar inocente do protagonista Austin e expõe os conflitos inerentes à paternidade atípica. Essa obra exemplifica como a arte pode humanizar e aproximar o debate sobre o autismo, demonstrando que, apesar dos avanços na divulgação de informações, a verdadeira conscientização ainda precisa ser aprimorada, pois o filme retrata um recorte que não é a realidade da maioria das famílias. No entanto, eu o recomendo para os pais. Enfim, enquanto nas telas existe um cuidado em retratar as questões referentes ao TEA com sutileza e leveza, a realidade vivida no Brasil é outra. E ao abrirmos as redes sociais, vemos que muitos casos relacionados ao autismo acabam nas páginas policiais das mídias locais e nacionais.

Na primeira semana de abril, período em que todas as mídias falam sobre a conscientização do TEA, na cidade de Cajamar (SP), um jovem dentro do espectro foi colocado de joelhos e espancado por meninas, enquanto o restante da turma usava de gargalhadas diante da cena revoltante. Muitas vezes, a violência e os preconceitos se manifestam contra pessoas que, por não decifrarem os códigos sociais tradicionais, acabam sofrendo injustiças e exclusões.

O leitor, nessa altura, deve estar se questionando: o mundo é mesmo assim ou agora tudo é autismo? Por que ele não se defendeu? Onde estão os pais desses adolescentes? Não chamaram a polícia? Entre outras questões, como: onde estavam as professoras? E eu pergunto: Que fenômeno social estamos vivendo em que a crueldade é filmada e divulgada? Onde está a humanidade?

E com esta reflexão me recordo que só a nossa espécie é capaz de destruir por nada a própria espécie, ou seja, só o humano é capaz de destruir o outro humano. Voltando à questão do TEA (Autismo):

É louvável que os municípios estejam se mobilizando para ampliar os atendimentos a crianças autistas, disponibilizando clínicas especializadas. Contudo, essa ação por si só não é suficiente. Falar de educação perpassa por valores familiares e culturais de igualdade social, de credo, raça/cor e gênero.

É igualmente crucial oferecer outras atividades — como natação gratuita, equoterapia, musicoterapia, aulas de pilates, dança, teatro, artes plásticas, computação, modelagem e escultura, entre tantas outras — que ampliem as oportunidades de desenvolvimento e promovam a inclusão em diversos aspectos da vida.

Educar é um processo coletivo que transcende o acadêmico, focando no desenvolvimento de habilidades sociais e empatia. Temos um provérbio africano que diz: “É preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”. Para formar cidadãos íntegros, é essencial que todos participem – da família à escola, da comunidade ao governo. O poder público tem um papel crucial nessa jornada, devendo garantir não apenas saúde e desenvolvimento, mas também segurança e Psicoeducação. Só assim construiremos uma sociedade verdadeiramente inclusiva, compassiva e respeitosa.

A legislação já prevê inclusão, mas é preciso que políticas públicas efetivas sejam implementadas para que pessoas com TEA (Transtorno do Espectro Autista) e outras dentro da Neurodiversidade possam exercer suas funções sem enfrentar obstáculos injustos. Nesse contexto, qual família que possui um filho neurodivergente pode ficar com o coração em paz por cinco minutos, ou não se munir de agressividade para defender o que é seu, ou ainda, não se inferiorizar a ponto de se isolar das atividades sociais?

Existe um estudo feito pela Universidade de Wisconsin-Madison (EUA) que diz que o cansaço e estresse das mães atípicas é comparado aos dos soldados em situação de guerra. Quando lemos esta única frase, o coração já se aperta ao imaginar a mãe desse rapaz da cidade de Cajamar ajoelhado e sendo espancado por uma jovem da mesma idade, pois não estamos falando aqui da violência territorial, com um viés em que os machos disputam o mesmo território; estamos falando de alguém que daqui a algum tempo irá gerar filhos. E eu me questiono dentro das minhas indagações: quando nós, mulheres, nesse contexto histórico, nos tornamos agressivas ao ponto de protagonizar essa cena cruel? Enfim, vamos voltar ao tema central.

A união entre o poder público, o comércio, as associações comerciais, as igrejas e outras instituições pode criar um ambiente mais acolhedor e inclusivo, permitindo que esses indivíduos mostrem suas capacidades e conquistem seu espaço de inclusão, lembrando que eles crescem e precisam de oportunidades no mercado de trabalho.

Nas minhas intervenções psicoterapêuticas com as famílias que acompanho,sempre enfatizo que as pessoas crescem e merecem ter suas potencialidades respeitadas.

Devemos ter cuidado para não incapacitar alguém além de suas limitações naturais, ou seja, valorizar as potencialidades.
Essa abordagem reforça a importância de uma educação parental atuante, que estimule o desenvolvimento, a autonomia e a resiliência. Afinal, o autismo não se restringe à infância; ele acompanha a pessoa ao longo de toda a vida, exigindo respeito, oportunidades e ações concretas em todas as fases.

É essencial que, juntos, possamos ponderar essas reflexões, lembrando que a verdadeira inclusão passa também por educar pais e familiares para que possam apoiar o crescimento de cada indivíduo sem reduzir suas capacidades a meras limitações. Em um mundo que ainda apresenta barreiras e preconceitos, é papel de todos nós – sociedade, instituições e poder público – promover um ambiente onde a diversidade seja celebrada e que cada ser humano possa alcançar seu pleno potencial.

Em abril, que o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo seja não só um marco de reflexão, mas um ponto de partida para mudanças efetivas que tragam mais dignidade e respeito para todos. Quanto aos agressores, o rigor da lei deve ser aplicado a todos os envolvidos, promovendo justiça e educação para prevenir futuros incidentes.

 

Autor

  • Solange R. Aroeira é psicóloga, pedagoga e Secretária da Mulher, Neurodiversidade e Inclusão Social em Cotia-SP. Especialista em neurodiversidade e educação especial, atua há mais de 15 anos nas áreas clínica, educacional e de recursos humanos. Palestrante e autora do livro "Como viramos estrelinhas: Finitude", dedica-se a promover ações estratégicas para inclusão social e cidadania plena. Redes sociais: @solangearoeira

    Ver todos os posts